Sérgio Peixoto: “Se estivermos dispostos a aceitar as nossas diferenças, isso pode ser um motivo de aproximação”

A paixão de Sérgio Peixoto pela música começou aos cinco anos. Da Academia de Música foi para o Instituto Gregoriano de Lisboa. Depois, licenciou-se em Ciências Musicais, na Universidade Nova, seguindo-se o curso de Composição na Escola Superior de Música de Lisboa.

A par da formação musical, fez parte do Coro Gulbenkian e fundou o ensemble de música antiga Sete Lágrimas, entre muitos outros projetos. Em 2008, tornou-se maestro do Coro da Universidade Católica Portuguesa.

Destes 15 anos, recorda com carinho duas atuações em particular: o Requiem de Fauré e um programa de musicais da Broadway. “O coro tem esta particularidade de fazer todo o tipo de repertório, desde música clássica a Beatles”, conta Sérgio Peixoto. Uma variedade de géneros musicais que se deve não só aos membros do coro, mas também ao próprio maestro. A sua maior referência musical é Bach, “a referência máxima para todos os músicos”, diz, revelando também uma admiração pela banda de rock britânica Queen.

Mas não é só o ecletismo musical que faz parte da sua história como maestro do Coro da UCP. Foi aqui, no coro da Universidade Católica Portuguesa, que nasceu o Projeto Mãos que Cantam, um coro de pessoas surdas que agora vai atuar na Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa.

Tudo começou há cerca de 12 anos quando o Instituto de Ciências da Saúde abriu a Licenciatura em Língua Gestual Portuguesa. “Os professores Alexandre Castro Caldas, Joana Castelo Branco e Ana Mineiro faziam parte do coro, vieram ter comigo e disseram: porque não integrar estes alunos na vida universitária e na comunidade académica, de uma forma diferente, através da música?”.

A ideia tinha sido lançada. Para Sérgio Peixoto, que “não tinha familiares ou amigos surdos, nem conhecia nada sobre a comunidade surda” foi um desafio. Mas logo no primeiro ensaio, entendeu a importância de abraçar este projeto.

Ao chegar ao ensaio, estavam seis estudantes surdos na sala. No entanto, a intérprete de língua gestual estava atrasada. “Na altura, eu não sabia língua gestual, e a única coisa que consegui dizer foi ‘olá’ com a mão. Não consegui comunicar mais nada. Sentir este choque repentino fez-me perceber que era mesmo isto que eu queria fazer”, explica.

Com o grande objetivo de desenvolver a Língua Gestual Portuguesa do ponto de vista artístico e estético, o Projeto Mãos que Cantam nasceu. “Não havia nada assim na Europa, por isso começámos do zero, a construir um léxico gramatical de gestos de direção coral para surdos”, conta.

Hoje, 12 anos depois, o coro já atuou com a orquestra Gulbenkian, Jorge Palma, Cuca Roseta e até Xutos e Pontapés. A intenção destas grandes atuações é “sensibilizar o público desses músicos de que é possível fazer música com pessoas surdas”.

Surge agora uma oportunidade para partilhar esta mensagem para uma audiência de centenas de milhares de jovens de todo o mundo. “Pela primeira vez na história da Jornada Mundial da Juventude, um coro de surdos vai interpretar as cerimónias”, juntando-se ao coro de 200 jovens e à orquestra de 100 pessoas, explica Sérgio Peixoto, esperando “que esta ideia de inclusão seja seguida nas próximas jornadas nos outros países”.

O grande objetivo do coro e do maestro “é que as pessoas olhem para os surdos como pessoas normais”, por isso querem “sensibilizar todos para esta ideia artística de que é possível fazer música com pessoas surdas, mas também provar que não há barreiras”.

“Se estivermos todos dispostos a comunicar, a compreender o nosso próximo, a aceitar as nossas diferenças, isso pode ser um motivo de aproximação entre todos nós”, afirma.

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